Revisão levaria a retrocesso em gestão, diz IBGC

Revisão levaria a retrocesso em gestão, diz IBGC

São Paulo – As idas e vindas nas indicações para a diretoria da Petrobras nos últimos dias tendem a provocar um aumento na percepção de risco dos investidores acerca dos rumos que serão dados à empresa em um ano eleitoral.

Se uma deterioração aguda nas perspectivas para o negócio não ocorreu, isso se deve, na avaliação de especialistas, aos aprimoramentos na governança da empresa trazidos especialmente pela Lei das Estatais.

Na terça-feira (5), o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), defendeu a revisão da Lei das Estatais, após o empresário Adriano Pires desistir de assumir a presidência da petrolífera.

Ingerência nas indicações

Segundo Pedro Melo, diretor-geral do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), a Lei das Estatais, que entrou em vigor em 2016, representa um marco na evolução das práticas de governança de empresas públicas e sociedades de economia mista.

Um dos maiores avanços da legislação, diz Melo, foi reduzir o risco de captura da empresa estatal por interesses político-partidários, fator responsável por casos notórios de corrupção, de ineficiência de alocação de recursos públicos e de atendimento a objetivos eleitorais e pessoais, em detrimento dos objetivos da companhia.

Após declarações que defendem a revisão na lei, o IBGC diz que não se devem admitir pressões por alterações de requisitos e vedações legais para facilitar a indicação de pessoas com atuação político-partidária ou em conflito de interesses para cargos da administração e do conselho fiscal de empresas regidas pela Lei 13.303/2016.

“Além de ir na contramão das boas práticas, tal flexibilização resultaria em retrocesso na governança das empresas públicas e sociedades de economia mista brasileiras e na agenda de integridade e de combate à corrupção”.

Na noite de quarta (6), o Ministério das Minas e Energia apresentou os nomes de José Mauro Ferreira Coelho para presidir a Petrobras e de Márcio Andrade Weber para comandar o Conselho de Administração da estatal.

Caminho para a OCDE

O diretor do IBGC lembra que o artigo 17 da Lei das Estatais estabelece requisitos e vedações para a ocupação dos cargos de membros do conselho de administração, da diretoria e do conselho fiscal. Esses requisitos, acrescenta, elevam a qualificação necessária para a ocupação desses cargos e mitigam o risco de conflito de interesses entre a companhia e os profissionais contratados.

“A Lei das Estatais foi reconhecida internacionalmente, sendo um dos pilares essenciais para o credenciamento do Brasil na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE)”, diz Melo.

Uma fonte próxima a investidores minoritários estrangeiros que prefere não se identificar diz que o risco de ingerência política não afeta somente a visão do mercado em relação à Petrobras, mas tem um impacto mais amplo sobre a percepção quanto à segurança institucional para fazer negócios no País.

Com as trocas no comando da empresa e o vai e vem de indicados, a mensagem que se passa para os bolsos internacionais, diz essa fonte, é a de uma desorganização e de um distanciamento em relação à base de investidores.

Lucro x preocupação social

Segundo Augusto Sales, professor da FGV Ebape (Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getulio Vargas), quando se discute o tema da governança de uma forma mais ampla no mercado brasileiro, um questionamento cada vez mais recorrente diz respeito a qual o objetivo final que uma empresa deve perseguir.

“O foco deve ser mais restrito a maximizar o lucro ao acionista? Ou, além da geração de lucro, focar outros elementos relevantes para a sociedade de forma mais ampla? É uma discussão em voga não só no setor público, mas também no privado, com o avanço das discussões sobre investimentos responsáveis sob uma ótica social, ambiental e de governança”, diz o professor da FGV Ebape.

Na avaliação do especialista, existe espaço, inclusive previsto no estatuto da empresa, para que a atuação no mercado não seja focada exclusivamente em gerar retorno aos acionistas, tendo também uma preocupação social. “O que não pode acontecer é o Estado abusar desse papel. É preciso que o direcionamento esteja dentro da estratégia de negócio da empresa”, afirma Sales.